PIRLS: nível socioeconômico tem grande impacto na habilidade leitora dos alunos brasileiros
Em sua primeira participação no Progress in International Reading Literacy Study (PIRLS) – avaliação internacional que mede a habilidade leitora de estudantes do 4º ano do Ensino Fundamental –, o Brasil registrou umas das médias mais baixas, como mostram os dados divulgados em 2023. Agora, nova análise realizada pelo Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional (Iede) a partir dos microdados do PIRLS traz recortes inéditos do exame, que revelam a influência do gênero, nível socioeconômico e da pandemia na habilidade leitora dos estudantes. Todas as informações podem ser consultadas no QEdu Países — plataforma que traz dados de estudos e avaliações internacionais, como PIRLS, PISA e TIMSS, possibilitando uma análise comparada entre países.
Os dados evidenciam a grande desigualdade educacional do Brasil e como a aprendizagem é afetada pelo Nível Socioeconômico (NSE) dos estudantes: 83,9% dos alunos brasileiros de alto NSE atingiram aprendizado adequado em leitura, contra 57,2% dos alunos de médio NSE e apenas 26,1% dos estudantes de baixo NSE. Por aprendizado adequado, o Iede considera estudantes que alcançaram pelo menos o nível intermediário da avaliação.
Vale ainda pontuar que, no País, 5% dos estudantes têm NSE alto, 31% NSE médio e 64% NSE baixo. Ou seja, os alunos de baixo NSE, com as menores taxas de desempenho adequado, são a maior parte da população estudantil.
No Brasil, a diferença entre o percentual de estudantes de alto e baixo NSE com aprendizado adequado é de 58 pontos percentuais (pp) — a maior entre os países participantes que têm dados disponíveis para essa questão. Em segundo lugar, estão os Emirados Árabes Unidos (52 pp), seguidos por Hungria e Bélgica Francesa, com 51 pp.
“O resultado do Brasil mostra uma grande desigualdade, mas, especialmente, um cenário de oportunidades para poucos. O grupo de alunos com alto nível socioeconômico é pequeno no Brasil, e esse grupo possui um resultado muito melhor que o da média e do grupo de alunos de baixo nível socioeconômico do País. Apenas 26,1% dos estudantes brasileiros de baixo NSE com aprendizado adequado é muito grave”, explica Ernesto Martins Faria, diretor-fundador do Iede.
Ao comparar a razão do aprendizado adequado entre estudantes de níveis socioeconômicos diferentes, o Brasil também se mantém entre os países mais desiguais: a proporção de estudantes de baixo NSE com aprendizado adequado é cerca de um terço da proporção de estudantes de alto NSE que atingem esse nível. Neste caso, porém, África do Sul, Irã, Jordânia e Kosovo tiveram proporções ainda menores que o Brasil.
Nível socioeconômico e proficiência em Leitura
Diversos estudos, nacionais e internacionais, mostram a correlação entre nível socioeconômico dos estudantes e aprendizagem, em razão do acesso deles a livros, bens culturais, pais com nível de escolaridade mais alto, entre vários outros fatores. Essa nova análise revela que, entre os alunos de baixo NSE, quase metade (49%) está no patamar abaixo do básico. Entre os alunos de NSE médio e alto, esse percentual cai para 16%.
Nos níveis mais altos de desempenho, a disparidade também se mantém, como mostra o gráfico a seguir:
“Não deveria nem existir alunos com nível de proficiência abaixo do básico – e não existe em muitos países. O fato desse percentual ser tão alto entre os alunos brasileiros de baixo NSE e existir em pequena proporção entre os de alto NSE revela que as escolas precisam buscar fazer mais ações para os estudantes de baixo NSE, que já não recebem tantos estímulos de seu ambiente familiar”, ressalta Faria.
Proficiência em Leitura e gênero
No Brasil há uma importante diferença de proficiência em Leitura entre os gêneros. A disparidade maior aparece entre os alunos com desempenho abaixo do básico. Na comparação, o percentual de alunos brasileiros do sexo masculino com desempenho abaixo do básico (44,1%) é superior ao das meninas (33,3%).
Entre os alunos com alto desempenho, a diferença é menor, mas ainda se mantém. Entre os meninos, 9,7% estão nesse grupo, já entre as meninas, 12,7% alcançam o nível de alto desempenho. A questão de gênero e desempenho em Leitura no PIRLS já foi tema de um livreto publicado pelo Iede, que mostrou que, em contextos de vulnerabilidade, os meninos são mais impactados do que as meninas em Leitura. Já quando as escolas têm bom clima escolar e não são consideradas ‘desfavorecidas’, a lacuna de desempenho entre os gêneros é menor (acesse o livreto aqui).
Influência da pandemia no aprendizado
No PIRLS, os estudantes também foram questionados sobre como sua aprendizagem foi afetada pelo período de pandemia. Entre os estudantes que consideram que foram “muito afetados”, 30,9% alcançaram o patamar de aprendizado adequado; entre os que consideram que foram “um pouco afetados”, 43,9%; e entre os que acreditam que “não foram afetados”, 48,4%.
Confiança na habilidade leitora
O PIRLS ainda traz recortes sobre contato com leitura, relação dos pais com os livros e autoconfiança. Ao cruzar a taxa de aprendizado adequado dos alunos brasileiros com sua confiança em leitura, os dados mostram que, entre os que se consideram muito confiantes, 62,9% alcançaram o patamar de aprendizado adequado. Ainda que esse seja um bom percentual para o Brasil, o número é bem inferior ao de estudantes de outros países que se consideram muito confiantes.
Percentual de alunos com aprendizado adequado que responderam ter “muita confiança” na própria habilidade de leitura:
Entre os estudantes brasileiros que se consideram um pouco confiantes, o percentual de aprendizado adequado em leitura é de 43%. Já entre os que se dizem “nada confiantes”, 16,4% têm um aprendizado adequado na disciplina.
Contato com a leitura antes do Ensino Fundamental
Os alunos que participam do PIRLS ainda respondem sobre seu contato com a leitura antes de iniciarem o Ensino Fundamental. A tabulação do Iede relacionou esses dados com o percentual de aprendizado adequado dos estudantes. Entre os que tiveram contato frequente com a leitura antes desta etapa, 49,7% alcançaram o patamar de aprendizado adequado. Esse percentual é de 36% entre os que responderam que seu contato com a leitura antes do Ensino Fundamental acontecia às vezes.
Percentual de alunos com aprendizado adequado que respondeu que seu contato com a leitura antes do Ensino Fundamental era frequente:
Gosto dos pais pela leitura
Os hábitos dos pais ou responsáveis também podem influenciar a habilidade leitora dos estudantes. Entre aqueles cujos pais responderam “não gostar de ler”, o percentual de aprendizado adequado em leitura foi de 32,6%. Já para os filhos de pais que dizem “gostar muito de ler”, 47,6% tiveram um aprendizado adequado em leitura.
Para saber mais, leia contribuições do Iede ao debate sobre a avaliação:
Agência Brasil: Maioria no país, alunos mais pobres têm menor aprendizado em leitura