Estudo do Iede mostra que escolas com altas taxas de participação na OBMEP têm notas mais altas no Saeb e no Enem
Dados são de avaliação de impacto conduzida pelo Iede, com parceria técnica do IMPA e do Lepes e apoio da B3 Social. O aumento da desigualdade dentro da escola é desafio a ser combatido na política
Criada em 2005, a Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP) tornou-se uma importante política pública para promover o ensino da Matemática no País. Na edição de 2024, a 19ª, a competição bateu dois recordes: o maior número de escolas públicas e privadas participantes (56.513) e a maior cobertura territorial já registrada (99,9% dos municípios brasileiros com pelo menos uma escola inscrita). Dada essa abrangência e relevância, o Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional (Iede) decidiu conduzir uma avaliação de impacto para entender os efeitos da OBMEP sobre a aprendizagem dos estudantes. Os resultados são positivos: escolas com alto engajamento na Olimpíada (pelo menos 65% dos estudantes classificados participam da 2ª fase) registram aumento da nota média em Matemática no Enem e aumento do percentual de estudantes dos anos finais do Ensino Fundamental acima do nível considerado adequado no Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb).
Essa avaliação é parte do estudo “O ensino e a aprendizagem de Matemática no Brasil: desafios, boas práticas e impacto da OBMEP”, lançado nesta segunda-feira (27), pelo Iede, com a parceria técnica do Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA), responsável pela OBMEP, e do Laboratório de Estudos e Pesquisas em Educação e Economia Social da FEA-RP/USP (Lepes), além do apoio da B3 Social.
A publicação traz um amplo mapeamento sobre o cenário da Matemática no Brasil, a partir de dados de avaliações nacionais e internacionais, e identifica quantas são e onde estão as escolas públicas que mais se destacam na disciplina, mesmo considerando os desafios relacionados ao baixo nível socioeconômico dos estudantes. Os pesquisadores estiveram em algumas dessas unidades, conversaram com a equipe gestora, professores de Matemática e estudantes participantes e não participantes da OBMEP e compilaram ações comuns que parecem contribuir para o bom desempenho dos alunos em Matemática.
Sobre a OBMEP, especificamente, o estudo avaliou quatro diferentes níveis de participação das escolas na competição: a) apenas na 1ª fase; b) nas duas fases; c) com alunos premiados; d) com altas taxas de participação na 2ª fase (mais de 65% dos estudantes classificados realizam a prova). Os números mostram que, quanto maior o nível de engajamento dos estudantes e escolas em relação à participação e esforço, mais expressivos são os impactos.
“Nas escolas de Ensino Médio com índices de participação na 2ª fase superiores a 65%, a OBMEP impacta o aprendizado em Matemática não apenas dos estudantes que se destacam na disciplina, mas de toda a turma. Há evidências ainda de redução na desigualdade de notas dentro da escola”, explica Roberta Loboda Biondi, pesquisadora do Lepes, que coordenou o estudo.
Isso não acontece, por exemplo, no grupo de escolas com alunos premiados com menção honrosa ou medalhas, mas que, não necessariamente, tiveram um alto engajamento da turma na 2ª fase. Neste caso, verificou-se aumento da média em Matemática no Saeb (9º ano do Ensino Fundamental) e na média do Enem, mas também aumento da desigualdade interna (distância entre as notas dos alunos de melhor e de pior desempenho de uma mesma escola). Esse é um ponto de atenção.
Outro resultado interessante para o Ensino Médio é que ter altas taxas de participação e alunos premiados aumenta o percentual de estudantes que alcançam uma média no Enem compatível com a nota exigida por faculdades públicas e privadas para a admissão no Ensino Superior.
Práticas das escolas de destaque em Matemática – A partir da análise de dados do Saeb, da OBMEP, do Enem e das taxas de rendimento das escolas foram identificadas 71 unidades públicas de anos finais do Ensino Fundamental (dentre 47.418) e 80 escolas públicas de Ensino Médio (dentre 20.606) que atendem estudantes de baixo e médio nível socioeconômico e conseguem bons resultados em Matemática. Esses são números que chamam a atenção e causam preocupação, já que não foram utilizados critérios demasiadamente rigorosos, e, ainda assim, dentre milhares de escolas, poucas dezenas obtiveram destaque em perspectiva nacional.
A pesquisa de campo aconteceu em três diferentes estados (nas regiões Nordeste, Sudeste e Sul), em escolas públicas que se destacam nos resultados de Matemática e tiveram estudantes participantes da 18ª edição da OBMEP. Entre os aspectos em comum entre essas unidades e que parecem colaborar para os resultados alcançados estão: a) a existência de uma boa relação professor aluno, com a criação de vínculos, e envolvendo confiança, respeito e apoio emocional; b) a preocupação dos professores com a aprendizagem de todos e todas, desenvolvendo estratégias para direcionar mais atenção aos estudantes que mais precisam (têm mais dificuldade); c) a busca por métodos e ferramentas que tornem a aula mais atrativa e, principalmente, a Matemática mais visual e concreta, como figuras geométricas, jogos construídos pelos próprios estudantes, aplicativos e softwares; e d) a oferta de aulas de Matemática com conteúdos mais aprofundados.
Já entre os principais desafios observados — não apenas nas unidades de destaque, mas em todas as oito escolas visitadas pelos pesquisadores — estão: a escassez de ações sistêmicas por parte das Secretarias de Educação voltadas à melhoria do ensino e da aprendizagem de Matemática; o alto percentual de professores sem formação adequada na área; turmas com níveis de aprendizagem muito heterogêneos; e precarização na contratação de professores (com muitos deles com contratos temporários e turnos em diversas escolas).
“Esse estudo traz importantes reflexões sobre a necessidade de mais ações sistêmicas na área da matemática. A OBMEP é uma dessas ações, mas são necessárias muitas mais diante de tantos desafios. As escolas que vão bem no país trazem contribuições como a importância do fortalecimento da relação professor-aluno, mas também mostram que as redes de ensino precisam de melhorias estruturais. É necessário mais investimento em formação e melhores condições de trabalho para os professores, sobretudo para atender a heterogeneidade dos alunos”, afirma Ernesto Martins Faria, diretor-fundador do Iede.
“Sabemos que o país tem inúmeros desafios na área da educação, e temos olhado de forma muito intencional para o ensino da matemática. Estudos como esse são essenciais para o setor identificar as melhorias iniciativas e intervenções para reverter esse cenário”, comenta Fabiana Prianti, head da B3 Social, associação sem fins lucrativos responsável pelas frentes de investimento social privado e voluntariado da B3, a bolsa do Brasil.
No site do Iede, estão disponíveis para consulta o relatório completo da pesquisa e também um primeiro informe sobre a temática, lançado em dezembro de 2023.
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Agência Brasil: Escolas que disputam Olimpíada de Matemática se saem melhor no Enem