Mapa mostra que cidades mais pobres sofrerão mais os efeitos do abandono escolar nos próximos anos
Escrita por Por Elida Oliveira, G1
“Certamente estamos em cenário mais desafiador hoje”, afirma Ernesto Faria, diretor executivo do Iede, que fez levantamento sobre exclusão escolar.
Escola em Melgaço (PA), em imagem de arquivo feita antes da pandemia. Cidade possui o menor IDH do país e tem 6 mil estudantes na área rural. — Foto: Divulgação/Secretaria Municipal de Educação
Os números se referem a alunos de 16 e 17 anos, são anteriores à pandemia, e acendem um alerta sobre possíveis desafios para manter os estudantes nas escolas durante o ensino remoto e na retomada às aulas presenciais.
Os dados foram levantados pelo instituto Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional (Iede) e fornecidos ao G1. Eles fazem parte do Indicador de Permanência Escolar desenvolvido pela entidade. Mesmo em estados mais ricos, como São Paulo, ainda há cidades com alta taxa de evasão.
No mapa abaixo é possível navegar pelos municípios para verificar o número de alunos, a taxa de exclusão escolar e a renda per capita em cada local.
Norte e Nordeste concentram os maiores índices de alunos de 16 a 17 anos fora da escola, com 13,3% e 11,9%, respectivamente.
“Certamente estamos em cenário mais desafiador hoje”, afirma Ernesto Faria, diretor executivo do Iede.
Para ele, o risco é ampliar a exclusão escolar em idades abaixo de 16 e 17 anos. “Voltamos a ter risco de evasão entre alunos mais novos, entre 6 e 14 anos, um problema que já havíamos superado, mas que voltou a ser ameaça por causa da dificuldade de conexão nas regiões rurais, por exemplo”, alerta.
Dados do Unicef indicam que houve redução de renda em 56% dos lares entrevistados, 24% dos estudantes deixam de fazer as atividades remotas porque precisam ajudar a família em tarefas domésticas; e 13%das pessoas que moram com crianças ou adolescentes mencionam que eles ficaram sem comer porque não havia dinheiro para comprar alimentos.
O Censo Escolar 2020 aponta que 89,5% das escolas não voltaram às aulas presenciais no ano letivo de 2020 e 54,3% dos estudantes não tiveram aulas on-line ao vivo durante ensino remoto em 2020.
O Censo também traz recorde de aprovação no ano passado, mas isso não quer dizer que os alunos estão aprendendo mais no ensino remoto. “Isso reflete uma recomendação do Conselho Nacional de Educação (CNE) de fazer aprovação automática e adotar um currículo contínuo entre 2020 e 2021”, afirma Faria.
Uma pesquisa divulgada no início de junho indica que se não houver ações para minimizar o déficit de aprendizagem ou retornar ao ensino híbrido, os estudantes do 3º ano do ensino médio deverão concluir esta etapa de ensino em 2021 sabendo 20% do esperado em português. Em matemática, poderão regredir.
Menor renda, mais alunos fora da escola
Na análise de municípios com mais de 500 alunos entre 16 e 17 anos, matriculados em 2020, quase três a cada dez cidades perderam mais de 30% dos estudantes porque eles saíram da escola antes de concluir o ensino médio. Os dados mostram que:
- 28% dos municípios de menor renda per capita tinham mais de 30% de alunos fora da escola;
- 22% dos municípios de renda per capita média tinham mais de 30% dos alunos fora da escola;
- 13% dos municípios de maior renda per capita tinham mais de 30% dos alunos fora da escola.
O desafio é redistribuir recursos para que estados e municípios que arrecadam menos possam investir mais em educação, afirma Faria. No Brasil, os primeiros anos da educação básica são de responsabilidade dos municípios. Do 5º ao 9º ano do ensino fundamental, é misto: há escolas das redes municipais e estaduais. Já o ensino médio fica a cargo dos estados.
“Tivemos avanço com o Novo Fundeb (fundo que distribui recursos para a educação básica), mas este indicador de fato orienta que a gente deveria dar mais atenção a estados e municípios mais carentes”, analisa Faria.
A queda de arrecadação durante a pandemia afetará ainda mais estes locais com déficit de recursos.
Impacto
Abandonar a escola antes de concluir o ciclo básico de ensino tira da população o aprendizado das disciplinas, como matemática, português, e também o desenvolvimento de competências que a escola oferece, como sociedade, e ética, por exemplo.
“Estamos em uma sociedade que o mercado de trabalho valoriza a finalização do ensino fundamental, médio, superior. A saída da escola gera uma sinalização de que este aluno tem menor desenvolvimento e pode fechar portas no mercado de trabalho”, analisa Faria.
“Garantir a permanência na escola é ter maior controle sobre o desenvolvimento deste jovem. Estados e municípios deveriam trabalhar em regime de colaboração para manter os alunos nas escolas”, defende.