Opinião | Ideb 2023 reforça necessidade de revisão
Por Ernesto Martins Faria, diretor-fundador do Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional (Iede) e Lecticia Maggi, diretora de projetos Iede, para o Correio Braziliense
O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) existe desde 2007 e é considerado o principal indicador de qualidade da educação brasileira. Em 2021, os resultados do Ideb foram de difícil interpretação, em razão das diversas peculiaridades do contexto de pandemia. Entre elas, o aumento das taxas de aprovação em razão do continuum curricular (proposta do Conselho Nacional de Educação de flexibilizar os currículos das redes e de não reprovar os estudantes para reduzir o abandono e a evasão escolares) e da menor participação de estudantes no Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), cujas médias em matemática e língua portuguesa são consideradas para o cálculo do Ideb.
Os dados do Ideb de 2023, divulgados pelo Ministério da Educação (MEC) nesta quarta-feira, também exigem bastante cautela ao serem analisados e trazem um veredito: já passou da hora de revisarmos o indicador. Sem desconsiderar a enorme contribuição do Ideb para o monitoramento da educação brasileira, as suas limitações proporcionam resultados pouco sustentáveis, como o fato de um município conseguir um índice 10 — para isso, além de serem aprovados, todos os estudantes tiveram que praticamente gabaritar a prova, acertando questões com nível de dificuldade muito superior ao de sua série escolar.
Em 2023, a expectativa era de uma queda nas taxas de aprovação em relação a 2021, quando havia a indicação de não reprovação, voltando a patamares próximos de 2019, que seriam mais “fidedignos”. Isso não se concretizou. Em todos os anos avaliados (5º, 9º e 3º do Ensino Médio), o indicador de rendimento (aprovação) superou o de 2019.
O aumento das taxas de aprovação em si é positivo, uma vez que diversos estudos indicam que somente repetir o ano escolar não contribui para o aumento da aprendizagem. Pelo contrário, está diretamente associado ao abandono e à evasão. Todavia, não podemos ignorar que o Ideb tem proporcionado a existências de taxas excepcionais de aprovação.
O norte do Ideb é na garantia de habilidades básicas e em uma aprovação escolar dos alunos que estão na escola, ignorando quem está fora e o grave problema de evasão escolar existente no paísUm exemplo de 2023 é o do Pará, que, no ensino médio, pulou de uma taxa de 0,82, em 2019, para 0,99, em 2023, superior a do contexto pandêmico. Isso colaborou fortemente para que o Ideb do estado na etapa saltasse de 3,4, em 2019, para 4,4, em 2023. O Mato Grosso é um caso similar: em 2019, teve taxa de aprovação de 0,79 no ensino médio e, em 2023, de 0,97. O Piauí também pulou de 0,88 para 0,97.
Perseguir uma alta taxa de aprovação é desejável. Porém, é preciso entender o quanto essas taxas não encobrem, por exemplo, um alto índice de evasão na rede de ensino. Essa dúvida seria mitigada caso o Ideb considerasse não apenas as crianças que estão na escola, mas também as que evadiram. Contabilizar a aprovação dos estudantes apenas nos anos ímpares é outra fragilidade, que pode impactar em taxas mais elevadas de reprovação nos anos pares (2024, por exemplo), e que seria facilmente corrigida considerando a aprovação em todos os anos escolares. Leia a análise completa no jornal Correio Braziliense