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Contribuições ao Debate - Nova Escola 06/09/2019

Como os Objetos de Aprendizagem podem apoiar o ensino

Pesquisa da Unesp usa esses objetos para complementar conteúdos previstos na BNCC

Um grupo de pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Araraquara (SP), do qual faço parte, está desenvolvendo um projeto em uma escola pública da cidade que busca usar Objetos de Aprendizagem como apoio ao desenvolvimento de conteúdos curriculares de alunos do 1º e 2º ano do Ensino Fundamental. Os Objetos de Aprendizagem são utilizados, de forma complementar, para abordar conteúdos previstos na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para estas séries. Dentre esses conteúdos podemos destacar: relacionar elementos sonoros (sílabas, fonemas, partes de palavras) com sua representação escrita; ler e escrever palavras com exatidão; identificar rimas e aliterações; utilizar números naturais como indicador de quantidade ou de ordem; realizar operações matemáticas de soma, subtração e multiplicação.

São sete turmas e cada uma participa uma vez por semana, durante uma aula de aproximadamente 50 minutos, com atividades realizadas no laboratório de informática da escola. Este projeto tem como objetivo analisar como os recursos tecnológicos podem ajudar no desenvolvimento cognitivo das crianças. Para isso, foi utilizado o conceito de Atividade Instrumentada definido por Rabardel (1995).

Para esse autor, os instrumentos são entidades híbridas compostas por uma parte psicológica e outra parte denominada de artefato. Os artefatos são os meios pelo qual agimos, podendo ser materiais ou não. No caso do projeto desenvolvido por nosso grupo, os artefatos são os Objetos de Aprendizagem. A parte psicológica é composta pelos esquemas, que seguem a ideia de schème de Piaget e Inhelder (2003), criados durante as operações com os artefatos. No sentido dado pelo autor, os artefatos só se transformam em instrumentos a partir das operações humanas, ou seja, um artefato para se qualificar como instrumento requer a participação psicológica e física de um usuário.

Somente quando está em uso, um artefato é posto em um sistema que envolve representações, conhecimentos, habilidades intelectuais e motoras, podendo, neste momento, serem criados ou associados esquemas de utilização e funcionamento.

A ideia que está sendo colocada é simples: quanto mais o artefato é colocado em uso, novas situações surgem para serem interpretadas e controladas, exigindo a formação de novos esquemas e, muito provavelmente, novas aprendizagens.

Instrumentação e instrumentalização

Ainda segundo Rabardel (1995), a atividade Instrumentada tem duas dimensões: a instrumentação e a instrumentalização. A Instrumentação é a descoberta gradual feita pelo sujeito das propriedades intrínsecas de um artefato. Está associada à acomodação de seus esquemas e com as mudanças de significado do instrumento, resultante da associação do artefato com os novos esquemas.

Já a instrumentalização pode ser entendida como um processo no qual o sujeito aprimora as propriedades do artefato. Ela acontece quando o usuário adapta as propriedades do artefato às suas necessidades, graças ao conhecimento que ele adquiriu sobre o artefato.

Por exemplo, um Objeto de Aprendizagem que propõe à criança escrever palavras iniciadas com a letra “P” partindo de sugestões feitas por meio de imagens é um exemplo de instrumentação, uma vez que a criança cria esquemas de uso da letra “P” e o Objeto de Aprendizagem cumpre seu papel de instrumento, pois oferece uma referência visual para executar a tarefa adequadamente.

Já quando a criança é capaz de pensar e escrever outras palavras iniciadas com a letra “P”, sem ficar restrita a referências visuais dadas pelo Objeto de Aprendizagem, temos um exemplo de instrumentalização, pois podemos considerar que ela se apropriou das funcionalidades do recurso e começou a utilizá-lo como um meio para ampliar sua capacidade de escrita e vocabulário.

No entanto, a instrumentalização não é simples e nem automática, ela tem maior probabilidade de acontecer conforme a criança vai conhecendo e se aprofundando no uso do instrumento. Para tanto, usar o mesmo Objeto de Aprendizagem várias vezes é fundamental – não no mesmo dia, ou em sequência. A ideia não é a pura repetição da mesma atividade várias vezes, mas o aprimoramento do uso da ferramenta.

Se você observar uma criança utilizando um mesmo Objeto de Aprendizagem em dias diferentes, vai notar que, em cada vez, ela presta atenção em algo diferente, faz as operações de uma nova maneira, passa a fazer corretamente o que antes errava. É um percurso natural de apropriação do instrumento, fazendo com que a criança modifique ou renove suas representações relativas ao instrumento, à realidade em que opera e aos processos e transformações que está aprendendo.

Em nosso grupo de pesquisa, já utilizamos essa forma de trabalhar com os Objetos de Aprendizagem em outros estudos de menor porte e funcionou de maneira bem adequada, ajudando as crianças na aprendizagem dos conteúdos escolares. Agora estamos trabalhando com um grupo bem maior de salas e os resultados preliminares também se mostraram positivos.

Silvio Henrique Fiscarellié mestre e doutor em Educação Escolar pela Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara (Unesp) e professor na mesma instituição

Para saber mais
RABARDEL, P. Les hommes et les technologies: une approche cognitive des instruments contemporains. Paris: Armand Colin, 1995
PIAGET, JEAN; INHELDER, BÄRBEL. A psicologia da criança. São Paulo: DIFEL, 2003.

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