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Contribuições ao Debate - Nova Escola 07/06/2019

Aprendemos mais quando acreditamos que somos capazes de aprender mais

Por Priscilla Tavares, para a coluna Pesquisa Aplicada, parceria de Iede e Nova Escola

Recentemente, a literatura em psicologia da educação tem dado bastante ênfase sobre as crenças que as pessoas têm acerca de sua capacidade de aprendizado, o chamado mindset. Num extremo, há indivíduos que acreditam que “eles são como eles são” e possuem baixas expectativas sobre seu potencial para aprender coisas novas. Essas pessoas, que são consideradas como tendo mindset fixo, em geral, evitam desafios, desistem de uma tarefa quando enfrentam obstáculos, não lidam bem com feedbacks negativos, valorizam mais os resultados do que a trajetória, tendem a atribuir a responsabilidade por resultados negativos a fatores externos e sentem-se desconfortáveis quando são comparadas a outros indivíduos bem-sucedidos. Com essa visão determinística do mundo, expõem-se menos a situações favoráveis ao aprendizado e não exploram todo seu potencial. No outro extremo, há as pessoas com mindset de crescimento, que procuram constantemente oportunidades para desenvolver suas capacidades. Elas abraçam desafios, persistem diante dos obstáculos, encaram os esforços como um caminho para se aprimorar, aprendem com as críticas e se inspiram com os resultados positivos alcançados por outros. Cada um de nós possui uma combinação dessas duas visões. E a ciência tem mostrado que é possível ensinar crianças (e também adultos) a mudar seu mindset e que há muitos benefícios nisso.

O comportamento dos pais e dos professores é fundamental para a formação das expectativas de aprendizado dos estudantes. A psicóloga Carol Dweck, professora na Universidade Stanford e referência mundial no tema “psicologia do sucesso”, argumenta que enfatizar, valorizar e premiar os esforços – ao invés de apenas os resultados – pode ser um bom caminho para construir altas expectativas de aprendizagem. Isso porque é importante que os alunos reconheçam que é possível obter conhecimento e desenvolver habilidades ao executar uma tarefa ou um projeto desafiador, mesmo quando o resultado final esperado não é alcançado. Os esforços devem ser vistos como oportunidades de crescimento.

As crianças que são avaliadas apenas pelos resultados finais enxergam os obstáculos como algo que devem evitar. Isso não quer dizer que o alto desempenho não deva ser almejado. Pelo contrário. Reduzir os padrões de avaliação não melhora a autoestima dos estudantes: só atingimos bons resultados quando acreditamos que eles podem ser alcançados.

Fornecer feedbacks aos estudantes pode ser outra ferramenta poderosa, principalmente se mostrarmos aos alunos que as críticas não são um veredicto sobre suas capacidades, mas sim uma rica fonte de informação sobre como aprimorar suas habilidades. Nesse ponto, em geral, acredito que erramos como pais e professores, pois temos a tendência em valorizar características inatas, como a aptidão para o esporte ou a facilidade para aprender matemática. Muitas vezes, classificamos como “esforçado” alguém que está em busca de bons resultados, mas nunca atinge o melhor deles. Com isso, fazemos com que os alunos enxerguem o esforço como algo pejorativo. E, pior do que isso, que acreditem que se não nasceram bons, nunca serão bons. Carol Deweck nos lembra que “ter um talento inato não é um objetivo; expandir seu conhecimento e suas habilidades, é.”

O trabalho de Blackweel e co-autores (2007) revela que as crenças na capacidade de aprendizado de alunos de ensino médio nos Estados Unidos estão associadas à sua resiliência e perseverança e fortemente relacionados com o seu desempenho acadêmico. A boa notícia é que as habilidades não-cognitivas são maleáveis, e evidências recentes em psicologia e economia da educação fornecem algumas pistas sobre como influenciá-las. É o caso do estudo feito por Bettinger e co-autores (2018), que conduziram um experimento com alunos noruegueses do primeiro ano do ensino médio. Os estudantes receberam informações sobre a plasticidade do cérebro e sobre estratégias que ajudariam a moldar sua capacidade de aprendizado, bem como sobre os benefícios potenciais de realizar esforço constante. Os pesquisadores encontraram resultados positivos sobre o engajamento dos alunos, medido como a persistência em exercer esforço e manterem-se focados em tarefas difíceis. Também foram encontrados efeitos positivos sobre as notas de matemática. Embora essa seja uma área recente de pesquisa, esses primeiros resultados sugerem que o mindset exerce um papel importante na trajetória educacional de crianças e adolescentes.

É preciso esclarecer que em alguns casos é mais fácil mudar o mindset predominante do que em outros. Aqui faz-se necessária a introdução do conceito de lócus de controle, criado na década de 60 pelo psicólogo norte-americano Julian Rotter. A palavra “lócus” em latim significa lugar. Lócus de controle seria algo como lugar em que reside a nossa responsabilidade ou controle sobre o que nos acontece.

As pessoas que têm lócus de controle interno superior ao externo acreditam que têm mais responsabilidade sobre os resultados que obtêm, ou seja, têm mais controle sobre a própria vida. Elas relacionam mais o próprio sucesso (ou fracasso) em alguma área a esforço pessoal, suas atitudes, escolhas, competências e habilidades. Por isso, procuram sempre se desenvolver. Já os indivíduos com predominância do lócus de controle externo tendem a atribuir a outras pessoas ou coisas a responsabilidade pelo que lhes acontece (sorte, destino, Deus, a empresa, a família…).

Lócus de controle não é algo imutável e pode ser influenciado por uma série de fatores, como religião, educação, contexto social etc. Por isso, crianças e jovens de nível socioeconômico mais baixo podem ter lócus de controle externo superior ao interno em razão da situação de vulnerabilidade em que vivem e das dificuldades que enfrentaram ao longo da vida.

Na escola, não há estudantes com lócus de controle neutro. Por isso, para os professores pode ser muito mais desafiador criar um mindset positivo em alunos com lócus de controle externo do que naqueles que já se veem como protagonistas do próprio destino. Mas, isso, obviamente, não deve nos desencorajar enquanto pais e educadores de tentar. Como o lócus de controle não é fixo, a escola também poder ajudar no desenvolvimento de um lócus de controle interno. É importante apenas sabermos que há cenários que podem ser mais desafiadores do que outros e que exigirão mais ações de reforço positivo.

Priscilla Albuquerque Tavares é doutora em Economia pela Fundação Getulio Vargas (FGV), mestre e bacharel em Economia pela Universidade de São Paulo (USP). É professora da Escola de Economia de São Paulo, da FGV, pesquisadora na área de Economia da Educação e autora de diversos artigos que avaliam impactos de políticas educacionais no Brasil.

Para saber mais:

Bettinger, E. Ludvigsen, S., Rege, M., Solli, I., Yeager. D. (2018). Increasing perseverance in math: evidence from a field experiment in Norway. Journal of economic Behavior and Organization.

Blacwell, L. S., Trzesniewski, K. H., Dweck, C. S. (2007). Implicit theories of intelligence predict achievement across an adolescent transition: a longitudinal study and an intervention. Chil Development. 78(1), 246-263.

Dweck, C. (2006). MindSet: The New Psychology of Success. Random House.

Acesse os artigos de Priscilla Tavares:
Metodologias ativas: 12 estratégias para facilitar o aprendizado dos alunos
Metodologias ativas: o papel do professor como facilitador do aprendizado dos alunos
Metodologia ativa x aula expositiva: é possível dizer que uma é melhor que a outra?
Metodologias ativas: entenda como elas favorecem a aprendizagem

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