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Contribuições ao Debate - Nova Escola 22/04/2019

Afinal, quando se inicia a alfabetização?

Confira estratégias para criar um ambiente alfabetizador significativo

Por Jordana Balduino e Bianca Rocha para a coluna Pesquisa Aplicada, parceria de Iede e Nova Escola

Primeiro dia de aula na turma do 1° ano do Ensino Fundamental. A família de uma criança que estuda na escola desde seus dois anos pergunta à professora: “quando vai começar de fato a alfabetização do meu filho? Até a Educação Infantil meu filho veio para a escola socializar, agora vai aprender a ler e escrever?”.

Essa questão é muito frequente, tendo a família a fantasia de que esse processo só se inicia no 1º ano. Porém, antes mesmo de entrar na escola, as crianças já estão imersas no processo de alfabetização, uma vez que, segundo Paulo Freire (1989), “[…] o ato de ler não se esgota na decodificação pura da palavra escrita, mas se antecipa e se alonga na inteligência do mundo”. Assim, uma vez que a criança esteja na escola, o professor deve ficar atento para não perder oportunidades de ingressá-la na cultura da escrita, preparando-a e conduzindo-a a vivenciar situações reais, pois a alfabetização é um ato social e, antes de tudo, tem uma função comunicativa.

Emília Ferreiro, psicóloga e pedagoga argentina, que obteve um de seus títulos de doutorado na Universidade de Genebra, sob orientação de Jean Piaget, desenvolveu respeitados estudos sobre a psicogênese da língua escrita. Em uma de suas obras, “A psicogênese da língua escrita” (1999)afirma que “a mão que escreve e o olho que lê estão sob comando de um cérebro que pensa sobre a escrita que existe em seu meio social e com o qual toma contato através de sua própria participação em atos que envolvem o ler e o escrever em práticas sociais mediadas para a escrita”. Considerando essa afirmação, o professor deve se atentar às produções de seus estudantes, deve investigar como eles estão pensando o percurso da escrita. Trata-se de um caminho árduo, cheio de desafios, hipóteses, conflitos e conquistas.

Emília Ferreiro e Ana Teberosk trazem essa questão em seus estudos e afirmam que as crianças dedicam um grande esforço intelectual na construção de formas de diferenciação entre as escritas, e é isso que caracteriza o período que elas se encontram.

Conhecer todas as etapas que as crianças passam ao longo do percurso da alfabetização e as possíveis hipóteses que elas levantam, deve ser uma das especialidades dos professores de Educação Infantil e séries iniciais do Ensino Fundamental.

Como o conhecimento se dá? Como ele se transforma? Quais instrumentos pedagógicos posso utilizar para que a criança avance no percurso da alfabetização? Essas são perguntas que o educador não pode perder de vista para que a alfabetização significativa aconteça.

O professor deve olhar como o estudante está pensando a escrita, além disso deve formar os melhores pares ou agrupamentos de crianças que se desafiam e selecionar ações significativas que envolvam a leitura e a escrita de textos com função social.

Avançar a criança no percurso de alfabetização diz respeito a trabalhar em seu conflito de escrita oportunizando atividades desafiadoras. Ou seja, um bilhete para solicitar material ao almoxarifado, um convite para alguém vir à sala ler um livro para a turma ou uma receita para fazer um bolo são alguns exemplos. Realizar uma pesquisa sobre as brincadeiras favoritas dos alunos e transformar as repostas em um gráfico de preferências ou ainda escrever um manual de como funcionam determinadas brincadeiras e depois ensiná-las para outra turma são também possibilidades que criam um ambiente alfabetizador significativo, em que a escrita e a leitura cumprem uma função social.

Portanto, o professor deve se atentar, em suas escolhas, a trazer o mundo para a sala de aula. A escolha dos recursos, pensados a partir de um olhar individualizado, é o grande diferencial: não faz sentido a cópia e a escrita de textos sem função social na atualidade. É necessário trazer para a sala de aula situações que possibilitem que a criança escreva espontaneamente. A literatura infantil, gibis, jornais, revistas, receitas, convites, manuais e muitos outros tipos de textos devem compor o ambiente escolar e serem utilizados para instigar o gosto pela leitura e a compreensão de mundo.

O mundo em que a criança está inserida é letrado e carregado de significados culturais. As crianças com suas capacidades vão, mesmo antes de ingressar na escola e iniciar o ciclo de alfabetização, construindo conceituações a respeito da escrita. As situações vividas pelas crianças – oportunizadas tanto pelas famílias como pela escola – propiciam condições para compreender a função e a existência da escrita. Desta forma, voltando à pergunta inicial da família, é necessário esclarecer que existe um momento na escolaridade em que a alfabetização se intensifica, compreendido por muitas escolas entre os 5 e 7 anos de idade. Esse ciclo de alfabetização tem a função de auxiliar quanto às regras de combinação das letras na formação das palavras, porém, sem deixar de lado a função e existência social desta escrita na sociedade. Portanto, a criança sempre esteve em processo de alfabetização! O que cabe à escola é desenvolver o gosto pela leitura, significar e desenvolver as habilidades de escrita.

*Jordana Balduino é psicóloga, com mestrado e doutorado em Educação e professora adjunta de Psicologia da Educação na Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás. (FE/UFG). Bianca Rocha é fonoaudióloga e psicopedagoga, há 25 anos dedica-se a formação de professores e à coordenação pedagógica de Educação Infantil e Ensino Fundamental I.

Para saber mais:

FERREIRO, Emília & TEBEROSKY, Ana. A psicogênese da língua escrita. Porto Alegre: Artmed, 1999.

FERREIRO, Emília. O ingresso na escrita e nas culturas do escrito: seleção de textos de pesquisa. São Paulo: Cortez, 2013.

FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. São Paulo: Cortez, 1989.

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